Imagens Fernando Azevedo e Aloísio Oliveira
A tarde do dia 13 de fevereiro de 2022 foi impressionante, surpreendente e muito especial.
Marcada pela proposta de descer o Rio Capibaribe, em Recife, utilizando caiaque.
Atividade essa, realizada através do Grupo Caiaque PE que a partir dessa prática, propicia a conexão com a natureza.
O trajeto em si, revelou sensações, emoções e impressões, que tocam profundamente a alma.
Além do impacto das imagens que se descortinavam durante o passeio.
Buscarei descrever aqui, nesse meu nano-fúndio tecnológico e babilônico, todas essas impressões.
Nosso ponto de saída foi no parque Jardim Baobá, que fica no bairro das Graças, na Zona Norte do Recife.
É um bairro nobre e que já foi morada de senhores de engenho. Atualmente é devidamente povoada por uma elite de poder aquisitivo médio para alto.
O parque é pequeno em extensão, mas muito arborizado. Fica em uma das margens do rio Capibaribe e tem esse nome em função da suntuosidade e tamanho dessa linda e antiga moradora do bairro.
O baobá ficou famoso pela popularidade da obra do escritor, aviador aristocrata francês Antoine de Saint-Exupéry, Le Petit Prince, estar do lado dela, é como se sentir dentro de um trecho do livro de Exupéry.
Imagem registrada com a gigante moradora, partimos para a nossa aventura. Receber as instruções, colocar as embarcações dentro do rio e partir rumo à Rua da Aurora.
O odor do Rio Capibaribe, nesse exato ponto é o de decomposição e a coloração da água é de um negro tão denso, que fica dificil imaginar se algum ser sobreviveria a esse habitat.
Pedaços de tocos, sacos plásticos, resto de isopor, amêndoas em decomposição e as Baronesas (plantas que aparecem na imagem) só refletem como a poluição é extrema nesse ponto.
Nas laterais, a vegetação de mangue, ameniza o barulho da cidade e propicia uma calmaria, para quem está dentro do rio, ou aproveitando o Parque Jardim Baobá.
Os prédios, que buscam tocar o céu azulado do Recife, dessa classe média alta, que contribui também para o aumento da poluição no rio. Reflexo de uma urbanização sem planejamento do tratamento de esgoto.
Capibaribe esse, que em tempos de outrora, foi rota de escoamento do ouro branco (açúcar), de escravos e de pequenas fragatas que protegiam de invasores, os engenhos de cana de açúcar. Um rio marcado por dor, sangue, escravidão e enriquecimento.
E a cidade, que não para de crescer, apresenta essa composição metálica, que se projeta sobre o Capibaribe.
Desbravar o rio é conviver com outras embarcações que alteram o espelho de agua. Nessas ondulações, do balanço do caiaque, surge o desafio de se equilibrar, assim como a corda bamba da vida.
Cruzando as pontes e vendo as margens do Capibaribe se distanciarem, com a sensação de que a maré estava se modificando.
A vida, essa senhora natureza, é uma insistente..... Insiste em sobreviver, mesmo em condições adversas, como as garças, capivaras e esses dois moradores dessa mangue-town de nome Recife.
A ponte José Barros Lima, que liga a Zona Sul ao Centro do Recife pela Avenida Agamenon era o limite das múltiplas cidades que o Recife possui.
o fundo a grandiosidade do complexo hospitalar privado do Recife seria o contra ponto do que nos aguardaria, alguns metros a frente.
A miséria, as casas sobre as palafitas. Algumas tombando abandonadas, outras com famílias morando, trazem o aspecto cru e visceral das desigualdades sociais.
Nesse ponto, senti diversos diversos odores... aquele predominante do rio, que nos acompanhava desde a partida, o cheiro de detergente com óleo, a fumaça de um espetinho de linguiça, se alternavam em cada metro avançado.
Recife: seus contrastes de palafitas e prédios suntuosos em seu Rio poluído e com vida. Éramos também observados por esses homens caranguejos, encrustados na beira do mangue.
Nesse momento tive a dimensão que o retirante de Morte e Vida Severina, da obra de João Cabral de Melo Neto teve. Via a vida brotando, em cada curva do rio. Muitas crianças acenavam, queriam interagir, falavam conosco e nós acenávamos para os pequenos moradores.
Já chegavamos ao centro do Recife. Pude registrar os traços da história. Detalhes de um Recife Antigo preservado, mas presente na ponte da Rua Velha.
Essas relíquias de outrora, que se perpetuam no tempo: A beleza do lampião e o gradil talhado.
Tínhamos chegado ao centro do Recife, com a Rua Dr. José Mariano ao fundo. Era a certeza que nos aproximávamos do fim de nossa jornada.
Nesse ponto ouvia uma pregação aos berros, de uma mulher, que aguardava o próximo milagre, cujo tom da voz, beirava o desespero.
As águas já não estavam mais negras, o marrom vinha com o doce aroma do mar e as ondulações refletiam a influencia da maré salgada.
Ao fundo a Rua do Sol (recebendo toda a intensidade da luz do sol vespertino), tendo a Ponte que corta a Avenida Guararapes e o prédio dos Correios à esquerda, bem como o monumental painel de flores de Francisco Brennand (construído em 1968) no canto da imagem à direita.
Um comentário:
Muito buono!
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